Gazeta Itapirense

Benzedor e Capitão da Congada já enfrentou o demônio durante exorcismo

Valmir José Destro Santos, 63 anos, é uma figura respeitada na cidade de Aguaí. Capitão da Congada de São Benedito e conhecido benzedor da comunidade, Valmir carrega em si o peso e a honra de uma tradição que atravessa gerações. Na tarde do dia 13 de maio, durante a Festa de São Benedito aqui em Itapira, ele nos concedeu uma entrevista logo depois de ter rezado o terço.

Desde os 6 anos de idade participa ativamente das manifestações culturais e religiosas do povo negro no Brasil, como a congada, a folia de reis e a dança de São Gonçalo. Aos 18 anos, assumiu oficialmente o posto de capitão, herança deixada por seu avô, com quem aprendeu os caminhos da fé e do compromisso espiritual.

“Meu avô já estava fraco, debilitado, e passou pra mim a responsabilidade e a missão religiosa. E eu abracei”, conta Valmir, emocionado ao relembrar o início de sua trajetória.

Nascido na madrugada do dia 25 de dezembro, em um parto realizado pela própria avó – benzedeira, rezadeira e parteira – Valmir acredita que seu dom espiritual já veio marcado desde o nascimento. “Na hora que eu dei o primeiro choro, o galo cantou. Minha avó disse: ‘Esse vai ser rezador, não vai escapar’”.

Desde os 8 anos, orientado pela avó Benedita, conhecida como Dita Benzedeira, ele passou a aprender as orações de cura e proteção. Mesmo analfabeta, ela transmitia seu conhecimento oralmente, em um aprendizado que se deu pela repetição e pela fé. Aos 15, Valmir começou a benzer crianças e, a partir dos 18, passou também a atender adultos.

Além de capitão da congada e líder religioso, Valmir tem papel fundamental na Paróquia São Benedito, em Aguaí. Atua na organização das procissões, nas festas religiosas e até nas situações mais complexas, quando, segundo ele, é chamado para ajudar em casos espirituais pesados, inclusive exorcismos. “O padre me chama quando precisa. A gente firma nas orações pra poder ajudar quem está precisando de um socorro espiritual”.

Valmir carrega em si o peso e a honra de uma tradição que atravessa gerações (Foto: Gilmar Carvalho/Gazeta Itapirense)

Casos impressionantes

Valmir relata já ter participado de rituais de exorcismo e afirma que tais práticas exigem dom e preparação. “O inimigo conhece quem tem luz. Se você não tiver preparo, ele enfrenta. Mas quando a oração é feita com fé e as palavras certas, ele obedece”.

Um dos episódios mais marcantes de sua trajetória ocorreu em Aguaí, com um jo’vem que teria feito um pacto e ficou três dias possuído, quebrando tudo em casa. “O médico dr. Ezequiel me chamou. Ele mesmo colocou no diagnóstico: ‘endemoniado’. A família queria internar achando que era loucura. Mas era espiritual.

Na hora da oração, o espírito do mal, no corpo do jovem falou: “ele (o jovem possuído) me prometeu, eu vim buscar um da família, mas fui impedido. Hoje eu não levo, mas outro dia eu volto”.

E o ‘Coisa Ruim’ voltou mesmo. Quatro meses depois, o pai do rapaz que tinha sido possuído foi encontrado enforcado”.

Apesar do peso dessas histórias, Valmir fala com serenidade e fé inabalável. “O benzimento é uma bênção de Deus. Muitos são chamados, mas poucos são escolhidos”.

Tradição viva

Hoje, Valmir compartilha seus conhecimentos com os mais jovens. Crianças que ele batizou já mostram sinais de vocação. “Esse aqui tem mão de benzedor”, diz, apontando para um de seus afilhados. “Já está na linhagem”.

Além da Congada de São Benedito, sua atuação inclui a folia de reis, o presépio – que já chegou a 18 metros de comprimento – e festas tradicionais como a de São Gonçalo, a festa junina e a recomendação das almas durante a quaresma.

“A gente mantém essa devoção que vem de raiz de família”, afirma. “É preciso penitência, fé e opinião firme para manter o dom. Quem cai no pecado, abre a porta pro inimigo. Mas quem tem coração puro e resistência, permanece firme na luz”.

Valmir já prepara a sucessão dentro da Congada de Aguaí (Foto: Gilmar Carvalho)

 

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